domingo, 4 de novembro de 2012

Vinte reais pela inocência de crianças #FimDaViolenciaContraMulheres

São Gabriel da Cachoeira é o maior município do país chegando a representar sozinho mais de 1% de todo o território nacional, sendo maior que estados como Rio de Janeiro e Pernambuco. Situado no extremo noroeste do Brasil em plena área de Floresta Amazônica e fazendo fronteira com Colômbia e Venezuela, o município já foi considerado área de segurança nacional (1968 a 1984) e abriga ainda hoje vários postos e quartéis das Forças Armadas. Quase 90% da população da região é comprovadamente indígena e até por isso é o primeiro município do país a aceitar oficialmente além do português, 3 idiomas nativos desde novembro de 2002: o Nheengatu, o Tukano e o Baniua. Sua economia é basicamente voltada para a agricultura de subsistência mesmo possuindo uma das maiores reservas mundiais de Nióbio segundo dados do próprio governo estadunidense.

Neste domingo São Gabriel virou notícia na imprensa do país. Não pelo Nióbio, por qualquer incidente nas fronteiras ou pela experiência pioneira de pluralismo linguístico. São Gabriel virou notícia pela violência dos não-índios contra os povos indígenas, mas não qualquer tipo de violência, uma das piores delas, a violência sexual contra as meninas. Está em artigo de Kátia Brasil, enviada da Folha à região, os relatos de 5 meninas que denunciam o envolvimento de vereadores, comerciantes e militares na compra da virgindade das crianças das etnias tariana, unana, tucano e baré. Uma das garotas, hoje com quinze anos, disse que chegou a presenciar "encontros de sete homens com meninas de até dez anos". Ao passo que a inocência é geralmente "comprada" por R$ 20,00, bombons, roupas ou celulares, o silêncio é obtido via ameaças de morte ("Não conte a ninguém ou lhe mato").

O caso não é novo. Já havia sido denunciado à polícia cívil do município há mais de um ano e após o longo período parado sem nenhuma evolução caiu na esfera da polícia federal no mês passado, para agora cair na esfera das redes sociais. O que esperar agora? Antes de mais nada que seja denunciado com todo o vigor e espalhado por todos os cantos como um verdadeiro escândalo precisa ser espalhado de maneira que São Gabriel de Cachoeira paute a imprensa por uma notícia da qual possamos nos orgulhar um pouco que seja: a prisão de todos os envolvidos nessa horrenda rede de pedofilia. Resolveremos o problema da violência contra meninas com isso? Claro que não. É impossível pensar o capitalismo sem a coisificação das pessoas, independente de gênero ou idade, e se é coisa, pode ser comercializado. Isso quer dizer que não temos o que fazer? Muito pelo contrário. Denunciemos e lutemos contra toda monstruosidade mas que não se perca a consciência que é preciso destruir o próprio capitalismo, ou todos os velhos monstros se erguerão novamente.

Um comentário:

  1. a reportagem é de kátia brasil, Giambatista. ato falho interessante esse, considerando o local e a população tema da reportagem.

    (eu gosto de nomes curtos. te incomodaria se te chamasse de Giam?)

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    de embrulhar o estômago essa história e muitas outras, infelizmente, cotidianas no brasil e no mundo. e em pleno séc. xxi!!

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    bom, faz tempo que a gente não se estranha, né?

    não acho que esta situação tenha a ver com o capitalismo. concordo quanto à questão de que tudo é transformado em mercadoria por este sistema econômico, inclusive os desejos, mas nesta questão específica, sabemos que a motivação é de outra natureza. isso acontecia (aconteceu) sob qq sistema econômico já experimentado pela (des)humanidade. a mulher sempre foi vista como um objeto para satisfação dos desejos masculinos. pra resolver isso, só modificando o status social da mulher. só o respeito pela mulher como ser humano pode fazer o homem perceber que existe mais do que um jovem corpo virgem diante dele. que existe ali uma pessoa. uma pessoa que merece respeito. por isso essa situação é muito mais complicada de ser resolvida. muito mais difícil. daí a importância de empoderar a mulher. mais ou menos como Sampat Pal Devi na índia (lugar que consegue ser ainda pior que os cantões do brasil pra uma mulher).

    o saka falou sobre isso tb.

    e uma leitora, Jaqueline Magalhães, postou um comentário muito interessante sobre o uso dos termos pedofilia e prostituição infantil (este último vc não usa, pelo menos não neste texto).

    segundo ela (e outras fontes, pelo que andei lendo, meio por cima), o uso do termo pedofilia é errado, na maior parte do casos. ela disse que pedofilia é um quadro psiquiátrico e que a maioria das pessoas que comentem violência sexual contra crianças não é pedófilo. não no sentido psiquiátrico.

    quer dizer, é gente normal, que inclusive mantém relacionamentos sexuais e afetivos com adultos, que leva uma vida normal, trabalha, tem vida social e tals, mas que se acha no direito de cometer esses atos contra meninas, principalmente, recém entradas na puberdade (o que torna tudo pior, obviamente). mais do que a mercantilização, são relações de poder. os poderosos “compram” a virgindade e empurram essas meninas para a exploração sexual por outros homens.

    nojento!!

    todos deveriam estar presos. há muito tempo.

    é preciso a mobilização da sociedade. só a pressão (muito forte) da sociedade fará alguma pedra sair de lugar.

    mas como, se são os homens que estão em cargos de comando em praticamente todas as instituições? como se os homens, quase todos, fariam ou desejam fazer a mesma coisa?

    como se as vítimas são sempre responsabilizadas? e os “deslizes” masculinos sempre desculpados. afinal, elas ficaram felizes com os 20 reais. elas consentiram.

    sempre se arrumam desculpas. o superior tribunal de justiça não absolveu um homem acusado de estuprar três meninas de 12 anos porque as meninas já eram prostitutas? quer dizer, se elas já eram violentadas todos os dias, um mais não faria a menor diferença.

    isso sem contar a ideia de que prostitutas não podem ser violentadas pois são prostitutas.

    tudo isso é tão absolutamente nojento!

    as autoridades estão comprometidas e fazem vistas grossas, pois usufruem das meninas também.

    a imprensa idem. só repercutem situações que degradam mais ainda a mulher.

    o que acontece lá, acontece no brasil inteiro, interior do pujante estado de são paulo inclusive.

    é preciso fortalecer a mulher.

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