sábado, 29 de dezembro de 2012

Que venha 2013... e que seja revolucionário.






Dois mil e doze agora é só lembrança #Retrospectiva2012

Dois e mil doze começou com cheirinho de luta e com esse mesmo perfume desfilou o ano inteiro, mas para cada passo perfumado não faltou o odor sufocante da repressão para nos tomar o ar.

Logo em janeiro, a Policia Militar do Ceará fez greve, recebeu apoio dos movimentos sociais e arrancou vitória do truculento governador do PSB, Cid Ferreira Gomes. Em Teresina a juventude foi à rua contra os aumentos de passagem mas lá a polícia não só não parou como passou literalmente por cima dos manifestantes. E em São José dos Campos, os moradores do Pinheirinho se preparam para o pior e infelizmente ele veio, com toda sua pompa de crueldade.

Em fevereiro foi a vez da PM baiana fazer greve mas lá a briga foi com o governador Jaques Wagner do PT, logo o PT que há pouco mais de uma década defendia o direito da polícia fazer greve. Na Grécia ocorreu a primeira greve de uma onda de protestos que correu o país durante todo o ano.

Março foi o mês dos portugueses pararem em greve geral enquanto que no Brasil, militares comemoraram o golpe de 31 de março de 1964 em um verdadeiro insulto à memória do povo brasileiro.

A crise européia se aprofundou mês a mês e em abril levou ao suicídio o aposentado Dimitris Christoulas, uma saída individual e desesperada, mas cada vez mais frequente não só na Grécia como em outros países da Europa como a própria Itália. Em Alagoas a truculência policial marcou presença com uma inusitada aula de democracia ("quem manda aqui sou eu").

Maio é o mês do trabalhador. Na Grécia, Espanha e França trabalhadores saíram às ruas mas nos Estados Unidos não (Galeano explica o por quê). Em Rondônia a violência contra grevistas mostrou que não existe idade para apanhar da policia e em Belo Horizonte o rapper Emicida foi preso por simplesmente colocar o dedo na ferida dessa maldita violência policial.

Em junho os operários da construção civil de Fortaleza entraram em greve contra a violência cotidiana do trabalho, enfrentaram a violência mentira dos jornalões da cidade e ainda assim conseguiram uma bela vitória contra seus patrões.

No mês de julho, uma marcha negra levou ao conhecimento do mundo a luta dos trabalhadores mineiros espanhóis. No Brasil as eleições e a reação democrática tomaram o palco enquanto lutas e a maldita repressão diminuíram seu ritmo, mas a imprensa seguiram seu rito de tentar desacreditar os que lutam.

A Rússia foi o grande palco da repressão à liberdade de expressão em agosto com a prisão das meninas do Pussy Riot. No Brasil uma conquista do movimento negro e do povo pobre se deu pelas mãos da justiça, foi pouco, mas ainda assim não deixou de ser conquista.

Na Espanha, a manifestação do 25 de setembro foi duramente reprimida e na Grécia bombas caseiras foram lançadas contra a polícia.

Outubro é mês de falar de revolução mas em ano par também é tempo de eleição. E entre esta e aquela a democracia burguesa normalmente fala mais alto do que a operária. Em Lisboa o clima de protesto chegou às passarelas e no Brasil a luta do povo Guarani-Kaiowá ganhou espaço nas mídias sociais.

Em novembro a Europa foi palco da primeira greve geral do continente com manifestações na Espanha,  Alemanha, França, Itália e Portugal. No Brasil, a justiça condenou os envolvidos no mensalão e o ministro da Justiça declarou (depois da condenação de seus amigos) que preferia morrer que ficar preso no Brasil.

E dezembro... dezembro é natal... o desejo de consumo foi celebrado nos quatro cantos do planeta enquanto os "ajudantes" de papai noel preparam muitos e muitos brinquedos, trecos e troços para serem comprados e distribuídos como presentes (ou seria oferenda?).

E assim mais um ano se foi. Que venha o próximo... e que seja revolucionário.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Os brinquedos de Natal não vem das mãos de gnomos de papai Noel.

É Natal! Tempo de festejar e presentear. Em especial, tempo de presentear crianças e reafirmar a história do bom velhinho barbudo de roupa vermelha viajando o mundo em seu trenó puxado por renas voadoras e distribuindo presentes para as crianças que se comportaram direitinho durante todo o ano. E como não são poucas as crianças no mundo, muitos e muitos brinquedos precisam ser fabricados. Na historinha de Noel, gnomos trabalham 364 dias do ano preparando os milhares e milhares de presentes que seriam distribuídos entre a noite do dia 24 e a madrugada do dia 25 de dezembro. Se a canção estivesse correta (aquela do "seja rico ou seja pobre, não se esquece de ninguém"), os gnomos teriam de produzir presentes para 27% da população mundial atualmente estimada em 7.086 milhões de pessoas, ou 1,9 bilhão de pessoas. Seria o equivalente a 5 milhões de brinquedos por dia contando que os gnomos não folgariam aos finais de semana.

Bem... preciso te contar uma "novidade": Papai Noel não existe, muito menos gnomos. 

Brinquedos são produto do trabalho humano. E diferente da grande indústria automobilistíca que esconde os operários propagandeando os grandes braços mecânicos montando veículos, a indústria de brinquedos é movida fundamentalmente por milhares e milhares de braços humanos. E como no capitalismo a finalidade da produção de qualquer coisa é a lucratividade, quanto menor o custo, maior o lucro. E por custo em produção de brinquedos entenda-se matéria-prima, instalações e principalmente gente. Não é a toa que 70% da produção mundial de brinquedos esteja exatamente na China onde o custo da mão de obra é dos mais baratos do planeta. E é barato exatamente porque o nível de exploração e a consequente extração de mais-valia é das maiores do mundo. 

O fotógrafo Michael Wolf registrou através de suas lentes algumas imagens da produção de brinquedos na China. As fotos mostram em sua grande maioria mulheres nas situações mais inusitadas, algumas delas trabalhando sem fardamento, sem máscaras, em bancadas mal projetadas, ao lado de latas de tintas  e dormindo em papelão ao lado da bancada de trabalho. Aí estão os verdadeiros ajudantes de Papai Noel produzindo felicidade (ou não) momentânea na base da exploração permanente. 

"Feliz" natal! 












sábado, 22 de dezembro de 2012

Papai Noel e os gnomos rebeldes (um conto de James Petras) (*)


Às vésperas do Natal de 2004, o intelectual estadunidense James Petras publicou um conto de natal bem inusitado chamado Papai Noel e os gnomos rebeldes que relata o que teria sido a produção e distribuição de presentes no Polo Norte há 8 anos atrás. Vale lembrar que em 2004 faziam então três anos do atentado do 11 de setembro que abriram as portas para a invasão do Afeganistão ainda em 2001 e do Iraque em 2003. O Haiti também vivia uma ocupação iniciada das tropas da ONU em junho daquele mesmo ano. E é nesse cenário que Petras nos conta a aventura de 10 gnomos às vésperas do natal que avizinhava com mais e mais brinquedos por produzir contando agora com as novas nações recém "libertas".

Há vários dezembros que gostaria de tê-lo traduzido e publicado. Mas como o conto é um pouco longo sempre deixei pra fazê-lo no Natal seguinte. Dessa vez saiu. Vale a pena ler até o fim.

Uma história de natal: Papai Noel e os gnomos rebeldes  

Ho, ho, ho! Papai Noel riu ao ver os 10 gnomos que vieram para a oficina cantando a música que ele lhes havia ensinado.

        Hi Ho Hi Ho
        Vamos trabalhar
        Trabalhamos todos os dias
        Não cobramos nada
        Hi Ho Hi Ho

Papai Noel sorriu feliz ao ver que caminhavam para seus postos de trabalho e começavam a produzir brinquedos para entrega de Natal.

"Teremos de fazer bonecos com rostos e mãos de cores diferentes", disse Papai Noel para os gnomos, "porque o Natal vai ser realizada em novos países como o Iraque, Afeganistão e Haiti, enquanto os sinos da liberdade ressoam por Cristo, o Salvador. "

A gnomo Maria franziu a testa, "Multicultural, multidinheiro;
Mais trabalho sim, mas quem recebe o dinheiro?"

Papai Noel olhou para as mãos ocupadas que costuravam bonecas e fios de solda para teclados eletrônicos. Satisfeito, ele soltou uma risada novamente "Ho, ho, ho!". Reprimiu um bocejo e caminhou para fora de sua loja para apreciar seu café da manhã ao lado de sua enorme lareira.

Logo que terminou sua terceira porção de salsichas e estava se preparando para tirar sua soneca no meio da manhã, veio uma forte batida de porta. Papai Noel chamou seu servo-gnomo para atender a porta. "Quem está aí?" perguntou Papai Noel com uma voz sombria.

"Sou eu, Papai Noel, Peter, o gnomo trabalhador".

"Ho, Ho, Ho, Peter, estamos todos trabalhando ... Ah, os trabalhadores no nosso jeito especial. O que ocorreu para você largar seu trabalho faltando apenas uma semana para o Natal? ".

"Joseph queimou sua mão soldando o video game, Bozo o destruidor."

"Basta dizer 'Bozo' - isso economiza tempo. Apenas uma mão queimada? Bem, então ele ainda tem outra mão e diga à enfermeira para não exagerar com o curativo, temos que manter os custos baixos para sermos competitivos com os chineses."

Peter ficou surpreso com a falta de interesse de Papai Noel. Este desprezo cruel para o irmão Joseph desmentia o seu riso jovial e olhos alegres. Mas ele correu de volta para a bancada.

Maria, sem perder o ponto, sussurrou: "O que disse o papai?"

"Continue cantando e continue trabalhando. Joseph tem um outra mão."

Maria começou a cantar:

        Hi Ho Hi Ho
        Trabalhamos todos os dias
        Não podemos falar
        Hi Ho Ho Hi Hi Ho

Automaticamente os outros gnomos juntaram-se a ela.

Pouco antes de ir almoçar e depois de terminar a sua soneca, Papai Noel apareceu para saudar seus gnomos. "Ho Ho Ho! Este vai ser um Natal muito Feliz para todas as crianças do mundo!", gritou e começou a cantar a música de trabalho para acelerar a produção. Em seguida, Papai Noel foi para seu descanso do meio-dia, duas horas de almoço com lagosta, sopa e bife, queijo, morangos e creme, regado por um bom vinho tinto.

Os duendes engoliram seus sanduíches de queijo e presunto antes do toque do sino de Natal lembrá-los que sua pausa de vinte minutos para o almoço havia acabado.

Maria olhou para o sofrido e pálido rosto de Joseph, da forma como caminhou lentamente de volta para seu banco. "Peter, esta noite nós temos que falar", disse ela.

Quando a escuridão caiu, e o dia de trabalho de 12 horas chegou ao fim, Papai Noel liderou o coro com sua voz forte:

        Hi Ho Hi Ho
        Vamos para a cama
        Trabalhamos todos os dias
        Não cobramos nada
        Hi Ho Ho Hi Hi Ho

Os gnomos estavam muito cansados, mas ainda assim tentaram seu melhor para cantar tão vigorosamente como Papai Noel - exceto Maria, que ficou em silêncio e pensando.

Depois do costumeiro jantar de sopa aguada de uma batata e biscoito velho como sobremesa, os gnomos cansados foram para suas camas, parando primeiro para falar com o ferido Joseph. Maria foi a primeira a falar, mas não para Joseph - mas sobre Joseph - e Papai Noel.

"Irmãos e irmãs. Todos os trabalhadores. Nós não invejamos Papai Noel com suas grandes refeições e sestas frequentes, sua lareira crepitante e seu anel grande no dedo indicador, mas não podemos aceitar a sua falta de interesse por Joseph!" Maria parou.

Os gnomos levaram um choque. Eles nunca tinham ouvido uma única palavra contra o alegre Papai Noel. Eles eram bem treinados e sempre comentou-se sobre quão cavalheiro, atencioso e alegre que ele era. Houve silêncio por pelo menos cinco minutos.

Peter tossiu e gaguejou. "O que podemos fazer? Podemos nós dizer ao Papai Noel o que é certo e o que é errado? O Papai Noel é do povo! ".

"É correto ignorar a lesão de Joseph de hoje, os seus ferimentos de amanhã, nossas dores de cabeça de sempre?" rebateu Maria.

"Nããão!" Responderam de uma só vez todos os gnomos.

"Amanhã vamos dizer ao bom Papai Noel que queremos ser tratados melhor  e que queremos mais respeito para os trabalhadores acidentados", gritou Maria.

No dia seguinte, antes do amanhecer, os gnomos rolaram para fora de suas camas, pegaram suas marmitas e dirigiram-se para trabalhar cantando sua música de trabalho habitual. Quando eles entraram na oficina, Papai Noel espiou da porta de sua casa grande, e sorriu alegremente sob os olhos inchados e vermelhos (resultado de algumas garrafas vazias de vinho) e juntou-se à música, aguardando que eles terminassem a cantoria para voltar para a cama. Mas eis que os gnomos alinharam-se em frente de sua casa em vez de ir para suas máquinas de trabalho.

Espantado, Papai Noel gritou: "O que acontece? Estamos há seis dias do Natal... as crianças ficarão desapontadas!".

Houve um silêncio de morte. Alguns gnomos viraram-se para seus bancos, enquanto outros olharam para baixo envergonhados. Todos pareciam nervosos e inquietos - exceto Maria, ereta e confiante.

"Papai Noel, nós estamos descontentes com a forma como você reagiu ao ferimento de Joseph de ontem. Queremos mais interesse e atenção quando um gnomo trabalhador é ferido no trabalho."

Papai Noel ficou vermelho e depois branco e depois verde, com indignação, raiva e avareza tudo de uma vez. Ele caminhou em direção a Maria, que não vacilou nem se virou.

"Eu quero que você saiba que tenho que me preocupar apenas com todas as crianças do mundo, e você se sente por um pequeno arranhão na mão de um único gnomo!" Papai Noel derramou seu desprezo em Maria e em todos os gnomos estavam a seu lado.

Os gnomos estavam envergonhados. Mas Maria disse calmamente.

"Mas se nós, os gnomos, com as nossas pequenas mãozinhas não fizermos os brinquedos e trabalharmos todos os dias, o dia todo e também parte da noite, nunca as crianças receberiam brinquedos, e você, Papai Noel, você não seria ninguém."

Papai Noel ficou furioso. "Estou com a boa ideia de enviar todos vocês gnomos de volta e trancá-los em seus quartos com pão seco e água!" ele gritou.

Maria já estava irritada com essas ameaças. "Nós não somos 'gnomos' - somos gnomos trabalhadores. E você sabe muito bem que não haverá brinquedos para entregar, se nós não os produzirmos!"

O bolso do Papai Noel falou antes de sua boca e disse-lhes que se não houvesse brinquedos não haveria o pagamento da véspera de natal.

"Eu te ordeno, Maria, para retornar ao seu quarto. O resto a trabalhar!"

Como os gnomos voltaram ao trabalho, Maria voltou sozinha para seu quarto frio. E enquanto os gnomos trabalharam o dia todo sem remuneração, Maria pensou profundamente.

"Ele me escutou quando estávamos juntos. Mandou somente a mim embora", raciocinou. Ela continuou, "Por que nós trabalhamos o dia todo sem pagamento e ele que não trabalha pega nosso salário? Por que trabalhamos o dia todo? Por que não somente meio dia e com pagamento? Por que Papai Noel não trabalha enquanto nós cantamos?

Ao cair da noite, Maria tinha feito um plano. E depois do jantar de sopa aguada, pão seco e um biscoito, Maria se levantou e falou. E todo ouviram pois se sentiam culpados por permitir que Maria levasse toda a culpa.

"Quando nos reunimos com Papai Noel sobre o ferimento de Joseph, ele teve que nos ouvir. Sozinhos, ele me afastou. Devemos estar juntos em solidariedade para que ele nos ouça. "

Todos os gnomos trabalhadores balançaram a cabeça concordando.

"Trabalhamos como escravos durante todo o dia e não recebemos nada; nós apenas cantamos sobre isso. Mas Papai Noel recebe dinheiro em suas viagens do dia de Natal. Devemos compartilhar esses pagamentos assim como fazemos com o trabalho. Vamos mudar nossa canção, tipo assim":

        Hi Ho Hi Ho
        Vamos trabalhar
        Queremos nossos salários
        Ou não vamos
        Hi Ho Hi Ho

"E para onde vamos?" Perguntou Matilda, a menor dos gnomos.

"Ficaremos em casa, faremos bonecos de neve, patinaremos no escorregador ... mas nós não trabalharemos", disse Maria.

"Mas Papai Noel ficará com muita raiva, ele não ficará feliz!", gritou Robin, o gnomo de bochechas vermelhas.

"Não importa. Queremos igualdade e liberdade!" gritou Maria, que foi acompanhada por todos os gnomos. "Amanhã vamos marchar até a porta de Papai Noel cantando a nossa música nova e dizer-lhe, antes de iniciar o trabalho, o que queremos!.

Na manhã seguinte, os gnomos-trabalhadores (agora se chamavam principalmente assim e alguns dos mais valentes unicamente de "trabalhadores") estavam muito animados e nervosos porque nunca haviam marchado para dizer qualquer coisa para o Papai Noel.

Maria puxou o canto mas todos cantaram mais alto do que nunca.

        Hi Ho Hi Ho
        Vamos ver Noel
        Nós queremos nossos salários
        Nós queremos o que pedimos
        Hi Ho Hi Ho

Quando chegaram à Casa Grande e bateram na porta, Papai Noel ainda estava de pijama vermelho, que mal cobriam sua grande barriga redonda.

"Ho Ho! O que é isso? É muito cedo para trazer seus presentes para o Papai Noel! Ho Ho Ho! "

"Não é um presente que trazemos. É uma petição. Uma petição coletiva. E é isso que nós queremos!"

Enquanto Maria lia as demandas, Papai Noel tinha a vontade de agarrá-la e bater nela, mas pensou melhor, pois não tinha certeza de como os outros nove gnomos reagiriam. Ele ouviu e fingiu um olhar alegre.

"... E se não recebermos nossos salários, não vamos trabalhar um único dia antes de véspera de Natal," finalizou Maria para a alegria de seus companheiros gnomos trabalhadores.

"Bem, eu vejo", disse Papai Noel ", então vamos todos ser pagos em seu devido tempo."

"Não", disse Maria sentindo uma farsa ou uma mentira, "queremos nosso salário hoje."

"Tudo bem", disse Papai Noel, "depois do trabalho pagarei a todos igualmente." Ele disse, com olhos risonhos.

Todos os gnomos voltaram para os seus empregos assobiando sua nova canção e os brinquedos voaram de suas mãos para as sacolas de entrega.

Sem o conhecimento dos gnomos, Papai Noel estava ao telefone ligando para ver se ele poderia produzir os brinquedos mais baratos na África, Ásia ou América Latina, onde os trabalhadores não reivindicavam salários e não havia Marias para ensinar música aos trabalhadores.

Mas para todo lugar que ele ligou, disseram que era tarde demais, faltavam apenas alguns dias antes do Natal.

No final do dia, Papai Noel contou os sacos de brinquedos e ficou muito satisfeito. Mas disse aos gnomos-trabalhadores que não poderia pagar porque o dinheiro ainda estava a caminho.

Naquela noite os gnomos se reuniram e desta vez estavam muito irritados porque tinham aprendido que o feliz Papai Noel havia mentido.

Matilda falou alto e claro. "Nós fazemos os brinquedos. Por que temos que esperar que ele nos pague?"

Robin continuou: "Ele sempre fala sobre o "nós" mas nunca levantou um dedo para fazer um brinquedo".

Ao fim de muitas falas, mais do que se pode ser lembrado, Maria falou: "Amanhã nós vamos dizer ao Papai Noel que não vamos deixar de trabalhar mas que ele deve se juntar a nós na linha ou que não deve receber nenhum pagamento."

Todo mundo gritou com alegria. E a pequena Matilda acrescentou: "E todos nós devemos compartilhar nossas refeições e repouso também!'"

Na manhã seguinte, os gnomos trabalhadores apareceram na porta e disseram que Papai Noel não era o proprietário, que não era "Papai Noel", mas "trabalhador Noel" e que eles iriam produzir e distribuir os brinquedos e se ele quisesse compartilhar desta situação, teria o seu lugar na bancada.

"Por que profana revolução que vai contra a criação de Deus?!",  ele gritou e quase desmaiou com a idéia de uma dia inteiro de pintura (de brinquedos).

"Quem não trabalha não come", disse Maria, enquanto os gnomos marchavam para o trabalho.

Ao meio-dia, os gnomos entraram na Casa Grande e compartilharam uma refeição suntuosa com legumes e frutas, peixe e queijo, enquanto trabalhador Noel choramigava baixinho resmungando sozinho. No meio da tarde, os trabalhadores pararam e fizeram uma pausa para a assembléia para decidir quais os horários mais adequados para o trabalho e para o lazer.

Logo era véspera de Natal e os gnomos-trabalhadores decidiram eleger quatro mamães e papais Noel para entregar os brinquedos e distribuir os pagamentos. E o velho Papai Noel ... O que aconteceu com ele? Ele logo percebeu que se ele não participasse das assembléias e do dia a dia da oficina em breve estaria sozinho, com fome e fora do mundo. Então ele saiu para trabalhar e cantou esta:

        Hi Ho Hi Ho
        Vamos trabalhar
        Nós temos nossa voz
        Recebemos o nosso salário
        Hi Ho Ho Hi Hi Ho

Os gnomos trabalhadores produziram brinquedos para as crianças mais do que nunca. Mas a entrega foi cheia de dificuldades. Mamães e Papais Noel tiveram que evitar os helicópteros e bombas no Iraque e as balas dos invasores ocupantes na Palestina.

"Ai dos invasores e ocupantes que negam a crianças o direito a seus brinquedos e felicidade!" Gritaram os gnomos.

"Vamos negar a eles e suas famílias os seus dias de festa e eles estarão para sempre fora das nossas listas de visitas de alegria."

(*) Traduzido de A Christmas story: Papa Noel and the rebellious dwarfs de James Petras.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Direitos iguais pra minha mulher? E quem vai fazer minha janta?


Há pouco tempo atrás, em uma atividade de propaganda para trabalhadores rodoviários em Fortaleza, minha esposa, que é uma ativista feminista, falou aos presentes sobre a necessidade de se defender os direitos iguais entre homens e mulheres. Um dos trabalhadores, meio que indignado com tamanha heresia,  disparou: "direitos iguais pra minha mulher? E quem vai fazer a minha janta?". A tensão estava instalada. O motorista expressou nada mais nada menos que o sentimento comum à imensa maioria dos homens e por incrível que possa parecer para alguns, também de uma imensa quantidade de mulheres. Seu azar é que falou em um auditório onde estavam presentes militantes feministas que nem que a vaca tossisse deixariam barato tal questionamento absurdo. E não deixaram. Já ele, levantou e saiu. Mas quer saber de uma coisa? Foi exatamente aquele trabalhador, que do alto de seu machismo, conseguiu expressar com a máxima simplicidade e mesmo sem querer, uma das questões fundamentais no debate da igualdade de gênero.

Parece brincadeira mas sinceramente não é.

O famigerado trabalho doméstico é o principal grilhão das mulheres trabalhadoras na sociedade capitalista. Quebre estas correntes e as consequências inclusive sobre aspectos como a violência contra a mulher sofrerão profundas mudanças das quais sequer conseguimos hoje ter quaisquer dimensões. Tire o fardo do cozinhar, lavar, passar, limpar, varrer entre tantas outras atividades das mulheres trabalhadoras e um mundo novo tende se abrir não só para essas mulheres mas também para seus companheiros. E isso sem falar no cuidar dos filhos que via de regra ainda recai mais sobre as mães que sobre os pais.

Segundo levantamento realizado pelo IBGE as mulheres colaboraram com 27 horas semanais em serviços domésticos no ano de 2011 enquanto os homens dedicaram 11 horas, pouco mais de um terço do esforço de suas companheiras. Somadas às 44 horas da jornada de trabalho brasileira, as mulheres trabalhadoras chegam à absurda quantidade de 71 horas de trabalho por semana. Essa é a famosa e maldita dupla jornada feminina.

E afinal de contas como enfrentar essa tal dupla jornada? Educando para que homens e mulheres dividam o trabalho cotidiano? Sim, educar é importante, mas honestamente não é suficiente. Mais do que tentar explicar aos homens que devem compartilhar o peso do trabalho doméstico com suas companheiras é preciso medidas concretas para enfrentar a pequena economia doméstica. Exatamente isso. Enfrentar! E isso só se pode ser feito por medidas governamentais com o sentido da transformação em massa dessa famigerada atividade que embrutece, oprime, sufoca e humilha mulheres. É preciso remover da esfera doméstica o lavar e o passar construindo lavanderias púbicas. Levar o "cuidar dos filhos" para o âmbito das creches e escolas públicas de qualidade em tempo integral, ao mesmo tempo que é preciso reduzir a jornada dos pais para que tenham mais tempo para conviver com suas crianças. É preciso garantir que haja milhares e milhares de restaurantes populares de forma que nem haja condição material de se questionar "quem vai fazer a janta". Medidas que dêem a condição de trabalho assalariado o esforço que recai como trabalho extra e sem remuneração sobre mulheres trabalhadoras.

Impossível? Claro que não! Mas se pode fazer isso no capitalismo? Bem... tanto quanto se pode fazer uma reforma agrária por exemplo que só pode ser tida como impossível porque não há como levá-la adiante sem enfrentar interesses dos grandes capitalistas. O governo da presidenta Dilma, por exemplo, poderia fazer isso? Bom... poder até poderia... se houvesse de fato interesse em fazê-lo, mas a presidenta já provou que não tem a menor disposição para tanto (nem na reforma agrária, nem muito menos na libertação das mulheres do trabalho doméstico). Isso nos leva a uma questão muito importante, que é a de que não será simplesmente "empoderando" mulheres que enfrentaremos os verdadeiros grilhões que aprisionam as trabalhadoras. As Luiziannes Lins, Anas Júlias, Micarlas de Sousa e Roseanas Sarneys que o digam. É preciso muito mais. É preciso subverter a sociedade que vivemos. É preciso derrotar o capitalismo. E é preciso que a esquerda, em especial a revolucionária, abrace realmente a necessidade da defesa desse conjunto de medidas como fundamentais para a emancipação de homens e mulheres.

Aos que não entendem o que isso tem a ver com a esquerda revolucionária encerro com um trecho do diário em que a comunista alemã Clara Zetkin cita o que disse Lênin sobre a questão da mulher:
"...odiamos tudo aquilo que tortura e oprime a mulher trabalhadora, a dona de casa, a camponesa, a mulher do pequeno comerciante e, em muitos casos, a mulher das classes possuidoras. Exigimos da sociedade burguesa uma legislação social em favor da mulher, porque compreendemos a situação destas e seus interesses, aos quais dedicaremos nossa atenção durante a ditadura do proletariado. Naturalmente, não o exigimos como fazem os reformistas, utilizando palavras brandas para convencer as mulheres a permanecer inativas, contendo-as. Não, naturalmente não, mas como convém a um revolucionário, chamando-as para trabalhar lado a lado a fim de transformar a velha economia e a velha ideologia".