sábado, 10 de agosto de 2013

"Carta às organizações da Esquerda sobre o machismo em suas Fileiras" (via @FeminismoSD)


O texto a seguir foi publicado no blog Feminismo Sem Demagogia há praticamente um mês refletindo ainda o espírito das jornadas de junho e o 11 de julho e trata de um tema caríssimo aos ativistas verdadeiramente socialistas e revolucionários: a necessidade de expulsar o machismo em todas suas variantes e manifestações das fileiras das organizações de esquerda. Como socialista, ex-militante de uma dessas organizações de esquerda e marido de uma super feminista fantástica também ex-militante, me vi praticamente empurrado a dar eco à postagem de Vera Silveira. Boa leitura!

Carta as organizações da Esquerda sobre o machismo em suas Fileiras

A esquerda socialista tem uma grande resistência em admitir o machismo dentro de suas fileiras, como se ao assumir se como socialista e ser militante socialista fizesse dos indivíduos automaticamente feministas, e sabemos que não é assim que funciona, desconstruir algo que foi enfiado em nossas mentes durante uma vida inteira e influenciou na formulação de opiniões e formas de agir não é algo fácil. Não. Ser socialista não te dá credenciamento para ser feminista e nem te livra de reproduzir o machismo, definitivamente.

Esta postura de entender as organizações de esquerda como algo perfeito, um lugar seguro onde não se reproduz as contradições históricas do machismo, racismo e homofobia (entre outras opressões) é um dos motivos que nos impede um debate, que de certo, se feito contribuirá para combatermos as opressões em nossas fileiras e até mesmo erradicá-lo.

Nestes últimos dias levantaram se várias manifestações pelo Brasil e a esquerda saiu à rua para apoiar e lutar junto com o povo e por suas reivindicações. Em espaços públicos onde poderíamos exercitar nossa camaradagem, e exercitamos em vários momentos, apareceram também às tais contradições que a esquerda insiste em não reconhecer dentro das suas fileiras, várias companheiras relataram casos de machismo sofrido por elas vindo de onde menos se espera: Dos próprios companheiros da esquerda.

Fica nítido nos relatos das companheiras denunciantes que os homens não conseguiram abrir mão da construção de uma política truculenta, intimidadora e provocadora, e se não entendem que isso trata se de uma forma masculinizada de fazer política é por que está tão naturalizado, que sequer a autocrítica conseguem fazer.

Esta forma de fazer politica deve ser questionada por todas a esquerda, não só as feministas, mas todos que desejam avançar a luta de classes, pois posturas enraizadas no machismo expulsam mulheres de nossas fileiras de militância todos os dias, para cada mulher expulsa, para cada mulher que se cala, a luta de classes se enfraquece, somos 50% da classe trabalhadora e que fique claro: Não se faz a luta de classe sem esta parcela significativa dos ativos.

Gostaria de salientar que este tipo de política não é exclusivo do homem, apesar de ser uma forma masculinizada de ação, é um modo naturalizado até por nós mesmos, as mulheres, sim o oprimido reproduz o discurso do opressor, e parafraseando Paulo Freire, sem uma educação libertadora, o sonho do oprimido será o de oprimir também.

O machismo não é algo para resolver depois da revolução, nenhuma opressão pode esperar, todas devem ser combatidas aqui e agora, e principalmente dentro de espaços que devem ser exemplo da sociedade igualitária que queremos. O machismo não é um ente etéreo, ele precisa de pessoas para se manifestar, e são pessoas que lutam contra uma opressão, a do capital contra o trabalhador, que estão reproduzindo outras opressões. Uma forma clara de observarmos o machismo são situações de Imposição de poder sobre as mulheres as quais devem ser criticadas por toda militância da esquerda.

As situações de imposição de poder sobre as mulheres se dão de várias formas, podendo citar aqui para compreensão: Interpelar as companheiras aos gritos, com gestos exagerados e intimidadores, desqualificação das opiniões, desqualificação inclusive das denuncias de machismo entre outras.

O machismo, esta forma de intolerância e imposição tem sido manifestada muitas vezes através da defesa apaixonada de posicionamentos políticos, confundindo as pessoas, mas não se trata de defesa apaixonada a posicionamentos, assim como não se trata de crime passional o feminicídio. Em nenhum dos dois casos há paixão, ambas são violência machista, e é necessário e urgente diagnosticar e combater a existência destas posturas em nossas organizações.

Infelizmente o contexto atual nos mostra que existe uma espécie de corporativismo entre as organizações políticas, onde o debate sobre o machismo é varrido para debaixo do tapete, não falo do debate superficial, falo do debate sincero e profundo sobre a questão, e quando vêm à tona situações de machismo companheiros e companheiras das organizações tratam como se fossem as denuncias oportunismo, como se partissem de pessoas que estão pré-dispostas a destruir estas organizações perfeitas que passam a ser defendidas com unhas, dentes e sectarismo, muito sectarismo. Esta defesa apaixonada dos militantes acaba por acumpliciar se da reafirmação do machismo em nossas organizações e expulsar as mulheres das nossas fileiras.

Confrontar o machismo é uma questão política, e ao contrário do que tenta se colocar não é menor, instrumentos de sansão aos militantes machistas devem ser aplicados para educação dos mesmos, para que reconheçam seus erros e não os repitam, pois não é justo que um camarada que utiliza se de métodos como intimidação, agressão física, verbal ou emocional, truculência etc. Continue representando publicamente as posições de sua organização política ou participar das reuniões de direção, ou será que é?

Gostaria de observar que pedir desculpas ou fazer autocrítica de forma privada, quando a agressão deu se de forma publica as mulheres militantes, dirigentes ou de qualquer organização política, principalmente as socialistas e de esquerda, não deve ser aceita. Pois quando uma agressão machista atinge uma mulher, atinge a todas.

Por entendermos que este tipo de opressão não deve se naturalizar dentro de organizações da esquerda, este debate deve fugir ao genérico e tornar se uma fonte de estratégias para combatermos o machismo tanto reproduzido pelo opressor, como reproduzido pelas oprimidas, conscientizando que nos lugares onde a classe trabalhadora se organiza para o combate ao sistema capitalista e suas classes, não há hierarquias de seres humanos e a prática do convívio de uma sociedade igualitária, deve começar a ser feita aqui e agora.

Vera L. da Silveira Aguiar

Coletivo Feminismo Sem Demagogia

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